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terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

O glorioso dia em que escorreguei em uma casca de banana


Era tão cedo, mas tarde demais, foi uma noite difícil, um pesadelo estranho, era melhor eu me apressar ou perderia o ônibus novamente, perder o ônibus virou rotina, era hora de quebrar a rotina. Cinco minutos até o ponto de ônibus, cinco minutos de prefacio para o que estava por vir.
O primeiro passo em direção a rua foi repelido por um tempo negro, nuvens escuras cobriam o azul do céu e a claridade do sol. Mais fechado que o tempo somente os rostos que encontrei quando tomei coragem e sai à rua. Vi uma vizinhança totalmente desconhecida que com gestos assustados recuava para suas casas, olhos nervosos olhavam de uma janela, nenhum cachorro ousava a insegurança da rua, mais adiante uma criança chorava ao chão na frente de uma casa, dentro da casa uma mulher alternava o olhar entre a criança e eu, talvez ela fosse a mãe da criança, não sei. A porta de um pequenino chalé se abriu bruscamente, a situação já estava bem estranha, mas aquela foi a cena mais bizarra que a nova vizinhança concebeu, da porta do chalé saíram quatro homens que com dificuldade carregavam um caixão, um padre os seguia cantarolando uma música religiosa, e logo atrás dele cinco mulheres de luto, duas choravam as outras iam com os olhos fixos no chão, o fúnebre grupo atravessou a rua me cortando caminho e entrou na casa a frente, a última mulher a entrar fechou bruscamente a porta, eu estava parado no meio da rua, perdido em pensamentos, olhava para a casa onde o grupo entrará, silêncio, total silêncio, neste momento uma risada estridente, tão estranha que chegou ao grotesco, quebrou o silêncio, olhei rápido e me deparei com a fonte de tal bizarrice, na frente do chalé de outrora, uma índia velha, anã e desdentada, fumava um cachimbo, fumava e continuava a dar risada, de repente parou e teve um acesso de tosse, um arrepio me percorreu a espinha, era hora de seguir ao ponto de ônibus.
Uma fria neblina começou, mas eu cheguei a tempo no abrigo do ponto de ônibus, lá havia uma garota, linda garota.
__ Oi!
__ Oi! __ respondeu ela com um tom vago.
Esperei o ônibus, passaram-se muitos minutos, eu o procurava no horizonte com os olhos, nada do ônibus.
__ Calma, ele sempre atrasa! __ disse a garota meigamente.
Eu não respondi nada, talvez tenha sorrido, mas não tenho certeza. Um ronco de motor me fez olhar novamente para o horizonte, lá vinha o bendito ônibus, lentamente, mas vinha. Senti alivio, lembrei-me de perguntar o nome da garota, ela me era tão desconhecida quanto meus simpáticos vizinhos, tarde demais, eis um mistério ou mais um mistério, ela desapareceu, sumiu, pra onde? Sei lá.
Percebi o quão carrasco é o tempo, não pude nem sequer fazer cogitações, pois o ônibus havia chegado.
Entrei no ônibus, o motorista e o cobrador eram as únicas formas humanas visíveis. “Cadê todo mundo? Será que hoje é feriado?”, pensei. Quando fui pagar a passagem mais uma surpresa.
__ Ah não, agora isso já não importa mais. __ disse o cobrador
Um pouco antes de sentar em um dos bancos, notei que havia outro passageiro, ele estava tão no fundo que eu não o enxergará antes, como não deu importância a minha presença eu o ignorei e sentei próximo à janela. Dá janela eu vi a fria neblina cessar, vi o dia escurecer mais e mais até virar noite e vi também que não tinha a menor idéia de onde estava.
__ Tarde demais aproveite o passeio. __ falou o cobrador, parecendo entender o meu desespero.
As possíveis explicações: “Peguei o ônibus errado!”; “É o apocalipse!”; “Nenhuma das afirmativas anteriores.”.
Começou a chover forte, não forte o bastante para abafar o estouro de um pneu furado, o ônibus parou.
__ Puta-que-pariu! O pneu furou? E agora?
__ Não faz mal, é o fim da linha. __ respondeu o motorista levantando-se do seu banco.
As portas do ônibus abriram. Motorista, cobrador e o cara do fundo do ônibus saíram, cada um carregava um saco azul, percebi que suas roupas lembravam um pouco o uniforme dos presidiários, “Besteira”, pensei, era melhor segui-los.
__ Hei, onde vocês estão indo? Não é melhor esperar por ajuda?
__ Cara, volta pra casa, a 800 metros daqui tem uma represa, se ela estourar você ta fudido. __ avisou o motorista.
__ Merd...
Neste momento escutei o som de uma imensa onda, ao longe, um dos três gritou que a represa estourou, então comecei a correr na direção contraria ao som, logo enxerguei luzes no horizonte, escutei o som de sirenes, era a policia, mas a gigantesca onda vinha no meu encalço, eu corria, o som de sirenes cada vez mais perto, para a salvação eu corria... Acordei, o despertador tocava insistentemente, pensei por um instante no pesadelo que acabará de ter, melhor esquecer ou iria acabar me atrasando, era hora de quebrar uma velha rotina.

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